segunda-feira, 10 de abril de 2017

Por que acabar com a Coordenação Geral de Petróleo e Gás da Diretoria de Licenciamento do IBAMA?


Neste texto explicamos o porquê de estarem acabando com a Coordenação Geral de Petróleo e Gás (CGPEG), unidade do IBAMA responsável pela condução dos processos de licenciamento de empreendimentos de petróleo e gás no mar brasileiro. A verdade é que o “grande problema” é que ela funciona e têm criado restrições para operação de empresas que, atualmente, produzem mais de 90% do petróleo explorado no Brasil.

A CGPEG, sediada no Rio de Janeiro, funciona desde 1998, tendo estabelecido um trabalho baseado na expertise técnica e no diálogo franco com as partes interessadas – sejam elas comunidades afetadas, órgãos de Estado ou empreendedores. Ao longo dos anos, consolidou uma equipe técnica de concursados e uma série de procedimentos que garantem um licenciamento ambiental efetivo. Isto significa se posicionar antes dos leilões de áreas exploratórias de petróleo, conduzir processos e projetos integrados de modo a avaliar e mitigar impactos cumulativos e atuar estrategicamente em agendas de longo prazo – dentre outras ações em prol do meio ambiente e da sociedade.

E isto incomoda a indústria. Principalmente agora, quando os preços de petróleo estão baixos e, devido à adequada estruturação de informações e processos, não há mais espaço para medidas protelatórias. Porque eles não jogam limpo! Vamos a alguns exemplos:

– Um dos principais impactos da produção de petróleo é o descarte de água produzida. Só que limpar esta água é um custo adicional que a indústria não quer bancar. Assim, apesar de o limite previamente estabelecido ser de 20 ppm de TOG, a Resolução CONAMA 393/07 trouxe um retrocesso ambiental, aumentando esse patamar após forte lobby da indústria: a máxima passou a ser de 42 ppm. Nesta discussão, um representante do setor chegou a afirmar “Sei que posso estar colocando minha cabeça na degola porque estou declarando, (em) alto e bom som, e ficará registrado, que praticamos valores acima de 20” para justificar esse aumento face a um limite que historicamente não vinha sendo ultrapassado conforme informações oficiais constantes no licenciamento. Até hoje, os dados enviados oficialmente ao IBAMA são estranhamente bem menores aos encontrados em análises independentes. Neste momento, a CGPEG está atuando para que, finalmente, a indústria cumpra a lei e pare de descartar toneladas de óleo anualmente no mar sob a forma de água produzida desenquadrada.

– Plataformas de produção e perfuração de petróleo são um dos principais meios de disseminação do coral sol, uma espécie invasora que compete com espécies nativas e pode trazer perdas de biodiversidade na costa brasileira, causando danos ao ecossistema marinho. Desde que tomou ciência disto, a CGPEG vem pressionado a indústria para tomar medidas que impeçam a introdução desta espécie e que mitiguem os impactos de áreas afetadas. Contudo, esta última vem colocando a responsabilidade no governo e evitando qualquer medida de resposta efetiva. Quando o Ministério de Meio Ambiente montou um grupo de trabalho para regular a questão, o setor rapidamente impediu o andamento do mesmo. Atualmente, estão sendo exigidas medidas em condicionantes de licenças ambientais que requerem a inspeção de plataformas e impedem o uso das mesmas em áreas sensíveis de modo a evitar que esta ameça atinja locais de grande importância biológica, como os bancos de corais de Abrolhos. Só que as empresas de petróleo e gás não querem atrasos, não querem limpar suas instalações e nem se preocupar com as vastas regiões em que espécies exóticas já se instalaram.

– O mar brasileiro está cheio de estruturas da indústria de petróleo e gás. Algumas servem a projetos de exploração em curso, mas uma boa parte é lixo. Tem até áreas específicas, chamadas singelamente de almoxarifados submarinos – sem nenhuma aprovação do governo, do IBAMA ou informação à Receita Federal – que servem para guardar peças que, muitas vezes, acabam por se transformar em sucata. Isso mesmo, foram deixadas no local, pois não tinham mais uso. Depois de muito cobrar um projeto para retirar todo este entulho do mar, a CGPEG conseguiu um plano estruturado que se encontra aprovado há anos. O detalhe é que o plano nunca foi iniciado. Atualmente, o cronograma do projeto prevê o início da limpeza da primeira área em 2021. Tem algum motivo? Ah, sim: não entrou no planejamento da empresa deste ano. E por que não inicia em 2018? Não há resposta e a verdade é que não interessa. Diante disto, esta coordenação passou a cobrar que todos os planos de desativação de plataformas contemplassem a destinação de toda a instalação e que os tais almoxarifados não fossem mais utilizados. Mas a indústria quer desvincular os processos, continuar a jogar e tirar coisas no fundo do mar a bel prazer, tirar plataformas para vender no exterior e deixar todo o sistema submarino para depois. Isso mesmo, depois de 2021, bem depois. Quem sabe nunca?

– Todo ano são comunicados dezenas de derramamentos de óleo no mar. Isto sem falar dos muitos que não são comunicados. Desde o ano passado, a Coordenação Geral de Emergências Ambientais e a CGPEG tem cooperado para apurar imagens de satélite que auxiliam na identificação de manchas de óleo no mar. E já foram encontradas dezenas de feições suspeitas com origem em plataformas, muitas com dezenas de quilômetros, que nem sequer foram reportadas. No mesmo período, cresceu o número de comunicados de incidente que, no entanto, estimam sempre volumes derramados diminutos. Acredite se quiser, mas já se informou 150ml de vazamento – e não foi apenas uma vez que chegaram valores desta monta. Quando o IBAMA consegue imagens através de sobrevoos ou vistorias, por vezes se verificam embarcações com manchas extensas de óleo nos seus cascos. Impossível se tratar de mililitros de óleo. É a estratégia que as empresas usam para não serem acusadas de não comunicarem acidente ambiental nem de causarem dano ambiental. Ao mesmo tempo, a CGPEG tem recebido recorrentes pedidos de redução da estrutura de resposta à emergência dos empreendedores. Ter barcos para recolher óleo é caro, contudo, é uma das salvaguardas estabelecidas no licenciamento ambiental. Esta coordenação vem conseguindo garantir que o país tenha capacidade de responder a acidentes com derramamento de óleo, mas a indústria busca minar esta conquista, inclusive com a tentativa de alteração da principal peça legislativa sobre o tema, a CONAMA 398/08. Todavia, enquanto os planos de emergência tiverem que ser aprovados pela CGPEG, a manutenção segurança ambiental continuará a ser um requisito a ser atendido.

E isso são só alguns exemplos dos maus resultados e intenções desta indústria, poderíamos continuar a lista: projetos de compensação atrasados; programas de educação ambiental parados; o problema dos fluidos de perfuração; entre outros. Isso sem falar do fato de, tirando parcas exceções, eles não pagarem nenhuma multa e nem mesmo a compensação ambiental que é exigida na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação! Mas os analistas ambientais pegam no pé da indústria. Entendeu agora por que estão acabando com a CGPEG? Pois é, o licenciamento incomoda tanto que precisa ser desestruturado. Tudo para as empresas poderem continuar a lucrar enquanto acabam com o meio ambiente.

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